CRONOLOGIA
Com base em documentos como a “Coleção das Leis do Império do Brasil” (1849), a “Corografia Brasílica, ou Relação Histórico‐Geografica
do Reino do Brasil ‐ Tomo II” (1818) e livros de relatos de “viajantes” como “Travels in Brazil in the year 1817 – 1820” (SPIX; MARTIUS, 1824)
apresentase um breve histórico da região de Rio de Contas,
pontuando os eventos mais relevantes de sua história.
Rio de Contas é a cidade mais antiga da região do Centro Sul Baiano e, segundo Neves (2007), esta região começou a ser ocupada em meados
do século XVII por escravos foragidos de embarcações naufragadas no
litoral da Bahia que subiam o Rio de Contas e se instalavam à margem esquerda do Rio das Contas Pequeno, atual Rio Brumado, ao sul da Chapada Diamantina.
Última década do século XVII – Pouso dos Creoulos
Na última década do século XVII, surgiu nesta região um pequeno povoado situado no Planalto da Serra das Almas, à margem do Rio das Contas Peque-no, chamado de “Creoulos”. Este povoado servia de ponto de pouso para os
viajantes vindos de Goiás e norte de Minas Gerais em direção à Salvador e na rota que ligava o Vale do São Francisco ao Caminho da Costa
(NEVES, 2007) (Figura 3).
Segundo Neves (2007), uma ampla rede viária já cortava o interior da Bahia em meados do século XVIII. Os caminhos de Ouro Fino ou do Ouro Boa
Pinta, a Estrada Real, a estrada das Boiadas (em grande parte se confundindo
com a Estrada Real), o Caminho da Costa, eram, sem dúvida, os mais impor-
tantes e os que estruturavam tal rede, a qual comportava diversos outros.
Figura 3 Caminho que ligava a cidade de Cachoeira no Recôncavo Baiano à cidade de Ilhéus (BA).
1710 – “Descoberta” do Ouro
Em 1710 bandeirantes paulistas descobriram veiões e cascalhos auríferos na região. Próximo às lavras do bandeirante paulista Sebastião Raposo surgiu
a povoação de Mato Grosso, onde os jesuítas construíram a Igreja de Santo
Antônio (REVISTA TRIMESTRAL, 1863).
1715 – Capela Nossa Senhora do Livramento
Os mesmos bandeirantes paulistas fundaram uma povoação rio abaixo onde foi construída a Capela Nossa Senhora do Livramento (REVISTA TRIMESTRAL,
1863).
1718 – Sede da Primeira Freguesia do Sertão de Cima
Por alvará de 11 de abril de 1718, Mato Grosso foi transformada na sede da primeira Freguesia do Sertão de Cima (COLEÇÃO DAS LEIS, 1849).
1720 – Relatório de Miguel Pereira da Costa
Viagem do Mestre dos Engenheiros de Campo Miguel Pereira da Costa, partindo de Cachoeira com destino a Rio de Contas. Em relatório enviado ao vice‐rei Vasco Fernandes Cesar, Miguel Pereira da Costa descreve não só as distâncias entre os povoados e aglomerações, mas também todas as
adversidades e peculiaridades do percurso de 105 léguas que durou uns 21 dias (Figura 4).
[...] do ribeirão se vai ao Mato Grosso, ultima marcha d’esta jornada por ser ali a rancharia maior dos mineiros d’aquelles distritos, onde todos têm na sua casa de palha, e aqui aportam todos os vivandeiros com seus combois[...]. É este sítio do Mato Grosso a primeira parte onde se ajuntou gente n’aquelles districtos, no principio de seus descobrimentos, e assim ficou sendo ali o maior concurso, ou uma como povoação d’aquelles homens em que se estabeleceram; e d’este sítio destacavam alguns a fazer os seus descobrimentos e experiências, que, tendo‐lhes conta, decampavam d’elle para a tal paragem descoberta, e nela formavam sua nova rancharia; ficando, porém n’aquelle acantonamento do Mato Grosso a maior parte d’elles, que ainda se conserva e é uma feira continua dos viveres que cada comboi leva. (REVISTA TRIMESTRAL, 1863)
Segundo Neves (2007), esse pioneiro documento sobre o Alto Sertão da Bahia equivale a uma carta de Pero Vaz de Caminha, com a vantagem de narrar
no início do século XVIII, um território já parcialmente ocupado por
colonizadores e com a toponímia ainda preservada em grande parte.
1724 ‐ Vila de Nossa Senhora do Livramento de Minas do Rio de Contas
Com o objetivo de evitar a evasão do “quinto4” e controlar as desordens o 4o vice‐rei do Brasil, D. Vasco Fernandes César de Menezes, o Conde de
Sabugosa, encarregou o sertanista baiano Pedro Barbosa Leal de fundar
vilas em Jacobina e Rio de Contas. Foi criada, então, a Vila de Nossa Senhora do Livramento de Minas do Rio de Contas, atual cidade do Livramento de Nossa Senhora.
Rio de Contas, Villa considerável e famoza; na estrada da Capital para Goyáz, creada por El‐rei D. Joam Quinto no anno de mil setecentos e vintequatro em razão do aumento, que tomava com as minerações de oiro, que uns Paulistas alli tinham descuberto em setecentos e dezoito. Esta numa planície lavada d’ares salutiferos junto da margem esquerda do Rio Brumado. As cazas sam quazi geralmente térreas, e de adobe, ou pau a pique sem regularidade, e branqueadas com tabatinga. A Igreja Parroquial he de invocação do Santissimo Sacramento. Tem Juiz de Fóra, e aula regia de Latim [...]. (COROGRAFIA BRAZILICA, 1817)
1726 – Casas de Fundição
A Provisão do Comando Ultramarino, de 13 de maio de 1726, determinou que se estabelecessem Casas de Fundição nas duas vilas,
Jacobina e Rio de Contas (COLEÇÃO DAS LEIS, 1849). A criação da Casa
de Fundição5 introduziu em Rio de Contas a técnica da joalheria, que gerou, por sua vez, uma metalurgia artesanal que foi base da economia
local até 1965 (AZEVEDO, 1980).
1745 – Transferência da vila
Por causa das febres que assolavam a população na época das cheias, a Provisão de D. João V ao Conde de Galveas, de 2 outubro de 1745, autorizou a
transferência da vila para o atual sítio, passando a denominar‐se
Vila Nova de Nossa Senhora do Livramento e Minas de Rio de Contas, enquanto que a antiga vila ficou conhecida como Vila Velha. Esta Provisão recomendava que o sítio escolhido devesse ser saudável e próximo a algum arraial já estabelecido (Creoulos) e:
4 Desde o século XVII, existia uma legislação que estipulava o pagamento de 20 % (1/5) do ouro descoberto e explorado. Com a descoberta do ouro o primeiro problema foi o de saber de que modo esse imposto - o quinto - deveria ser cobrado: utilizaram-se, basicamente, três formas: a capitação, o sistema de fintas e as Casas de Fundição. 5 Neste regime de cobrança os mineradores eram obrigados a enviar o ouro em pó para ser fundido e transformado em barras com o selo real nas Casas de Fundição, onde o ouro era automaticamente quietado.
[...] que se faça delinear por linhas retas áreas para as casas com seus quintais [...] as quais pelo exterior serão todas no mesmo perfil, e ainda que no interior os fará cada um dos moradores à sua eleição, de sorte que em todo o tempo se conserve a mesma formosura [...].(COLEÇÃO DAS LEIS, 1849).
Este novo sítio era rico em ouro de aluvião o que provocou o seu rápido crescimento.
1746 – Santíssimo Sacramento das Minas de Rio de Contas
A mesma Provisão transferiu de Mato Grosso para a nova vila, instalada em 28 de julho de 1746, a sede da Freguesia que passou a se designar de
Santíssimo Sacramento das Minas de Rio de Contas (COLEÇÃO DAS LEIS, 1849).
1799 – Declínio
Época em que começou a declinar a produção de suas lavras, mas mesmo decaindo a extração de ouro, Rio de Contas continuava uma parada obrigatória
nos caminhos reais6, que partindo de Cachoeira levava a Goiás e ao
Mato Grosso e por onde passavam as romarias que demandavam a
Bom Jesus da Lapa na Bahia (AZEVEDO, 1980).
1800 ‐ Desenvolvimento Urbano
A sociedade da mineração na Bahia foi puramente urbana. Rio de Contas
ganhou cadeira régia de gramática latina em 1799 e tenda de química
e gabinete mineralógico em 1817. Em 1818, Spix e Martius observaram
que a população de Rio de Contas “pela educação e riqueza, se distingue dos outros habitantes do interior da Bahia” (AZEVEDO, 1980).
1833 – Comarca
Em 1833, quando a Bahia foi dividida em 13 comarcas, criou‐se entre
elas a do Rio de Contas, que então foi desvinculada da comarca de Jacobina.
A comarca de Jacobina, [...] natural pela sua extensão que venha a ser repartida em duas, quando a multiplicação dos povoadores tiver multiplicado as Povoações, ficando a Villa de Rio de Contas cabeça da comarca futura. (COROGRAFIA BRAZILICA, 1817) 6“Caminho do Ouro Fino”
ligava Salvador a Jacobina (1720); “Estrada Real” ligava Jacobina a Rio de Contas; “Caminho de Tacambira” ligava Rio de Contas a Minas Novas; “Caminho do São Francisco” ligava a foz do Verde Grande até a confluência do Paramirim; “Caminho do Paramirim”, subia o rio até o Alto Sertão da Bahia; “Caminho da Bahia” do Alto Sertão para o Recôncavo da Bahia de Todos os Santos (NEVES, 2007).
1844 – Emigração da população
A estagnação de Rio de Contas começou em 1800 e agravou‐se em 1844
com a emigração de grande parte da população para as minas de
diamante recém descobertas em Mucugê e Lençóis, sendo que esta
última passa a ter a influência que Rio de Contas exerceu durante um século sobre a região (AZEVEDO, 1980).
1879 ‐1880 ‐ Expedição pelo rio São Francisco e pela Chapada Diamantina
Expedição realizada pelo engenheiro Theodoro Fernandes Sampaio pelo rio
São Francisco e a Chapada Diamantina realizados na Comissão Hidráulica
do Império:
[...] Como quase todos os lugares que tiveram origem na mineração, a Vila do Rio de Contas cresceu irregularmente, desenvolveu‐se e prosperou com o progresso das lavras auríferas do leito do Brumado, e por fim estacionou ou descaiu com o esgotamento das minas. Todavia, alguma coisa lhe ficou da prosperidade de outrora. As suas construções de pedra e seus edifícios públicos revelam ainda que esse lugar teve um nascimento rico e promissor, que o futuro aliás não confirmou. A vila não tinha mais que uns trezentos prédios e sua população não atingisse 2 mil almas”. (SANTANA, 2002)
1885 – A Cidade
Pela Resolução Provincial no 2544, de 28 de agosto de 1885, a vila foi elevada a categoria de cidade. O município primitivo estendia‐se ao limite do estado de Minas Gerais, compreendendo a Serra Geral, quase toda
a Chapada Diamantina e Bacia do Rio de Contas, grande extensão da Bacia do Paraguaçu e parte da Bacia do São Francisco
(AZEVEDO, 1980).
1932 e 1939 ‐ Corrida do Ouro
Em 1932,com a descoberta de novas lavras, ocorre uma nova corrida do ouro.Rio de Contas sai da estagnação em que se encontrava, com a volta e permanência da população e a circulação de capital.Este foi um curto
período que durou até 1939.
Final da década de 1970 a 1980 ‐ A cidade Histórica
Rio de Contas foi inscrita no Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, no dia 8 de abril de 1980, sob inscrição de número 076 (0891‐T‐73).
O tombamento inclui o centro histórico da cidade que mede 18,91 ha, e
compreende 287 edificações, das quais 18 constam do Inventário de Proteção do Acervo Cultural da Bahia. Estas edificações foram inventariadas
entre 1978 e 1980 (AZEVEDO, 1980).
1977 a 1983 ‐ Construção da Barragem Engo Luis Vieira
As obras de construção da barragem na cidade de Brumado vizinha à cidade de Rio de Contas, construída no período de 1977 a 1983 foi o principal
posto de trabalho da população de Rio de Contas no período.
Com capacidade de 105.000 m3 foi construída para o abastecimento da região (SUASSUNA,1999).
1986 – Conservação do sítio histórico
Por iniciativa do IPHAN e participação dos moradores, as fachadas do centro histórico foram limpas e pintadas.
1989 – Obras de conservação do sítio histórico
Parceria entre IPHAN,a Prefeitura Municipal de Rio de Contas e os moradores,realizaram novas ações de conservação (limpeza e pintura das fachadas
e reparos no calçamento das ruas).
2003 –“Prêmio especial conservação do patrimônio – Guia Brasil”
A cidade de Rio de Contas foi reconhecida pela conservação do seu patrimônio arquitetônico, sendo destaque nacional juntamente com a Casa de Cora
Coralina, em Goiás (GO) e o Parque de Vila Velha, em Ponta
Grossa (PR).
* * *
Esta breve cronologia da cidade de Rio de Contas procura traçar um panorama histórico da cidade valendo ressaltar aqui algumas impressões de outros
viajantes como Aguiar (1888), que descreve algumas peculiaridades da
cidade:
[...] no geral [a cidade] possui casas cômodas, sólidas e asseadas, além de excelentes sobrados [...] ruas planas, largas, compridas e paralelas, desembocando em duas bonitas praças. O comércio insignificante está reduzido a umas quatro lojas e tantas casas de molhados [...] a feira é bastante acanhada. A população, avaliada em mais de 60.000 almas, acha‐se dividida por seis paróquias [...] é felizmente o que tem mais escolas. A indústria da cidade consiste no trabalho proficiente de todos os metais [...] As melhores bridas conhecidas são as que lá se fabricam [...] as mais finas obras de ouro e prata, os mais delicados lavores [...] são de rara perfeição.
Rio de Contas nadou em ouro, todas as contas eram pagas e cobradas em oitavas [...]. (AGUIAR, 1888)